*Waldyr Senna Batista
A adesão à festa de arromba que a direção da Câmara municipal pretende realizar para congraçamento “entre vereadores e servidores do legislativo” e que o jornalista Jorge Silveira, com muita propriedade, considerou um despropósito, porque custeada com recursos do contribuinte, parece ter superado as previsões iniciais. Tanto é assim que foi publicado “aviso de retificação de edital” em que o número de garçons a serem contratados sobe de oito para quinze. Quer dizer: despropósito em dobro.Essa festança alimenta a impressão, que alguns têm, aqui do lado de fora, de que a Câmara não precisa guardar relação com a realidade do município, embora seja por ele integralmente mantida. A prefeitura está em crise, contingenciando despesas desde cafezinho e papel higiênico, até o consumo de água, combustíveis e energia elétrica, sem falar na queda de qualidade de serviços rotineiros, como coleta de lixo, e os vereadores se dão o luxo de fazer festa servida por quinze garçons. Imagine-se o custo dos demais componentes, como bebidas e comida.
O estado de penúria que impera no executivo é ignorado pelos integrantes do legislativo que, todo mês, com absoluta prioridade, recebe a parcela de recursos que a lei lhe garante, calculada na base de 6% da arrecadação, sem que dele se exija publicar prestação de contas para conhecimento de quem banca o gasto, o contribuinte.Os servidores do executivo ganham salários de fome, congelados há anos, enquanto os da Câmara são remunerados em níveis muito superiores, revistos anualmente em percentuais expressivos. Os ocupantes de cargos de confiança na prefeitura tiveram seus vencimentos reduzidos, como forma de contribuir para amenizar a crise que assola as finanças municipais, mas os vereadores, que custam aos cofres públicos R$ 16 mil por mês, cada um, continuam embolsando o que eles próprios estabelecem como remuneração, às vezes até com práticas que levantam suspeitas, como ocorreu com oito deles, que vêm de ser denunciados à Justiça federal, pelo Ministério público, depois de terem sido presos e algemados, sob acusação de usarem recibos falsos para comprovar despesas de gabinete.É no mínimo estranha essa disparidade, que agride o bom senso da população que paga impostos e recebe da prefeitura serviços incompatíveis com o nível de importância da cidade, haja vista o estado lastimável das ruas, praticamente intransitáveis, devido aos buracos e aos remendos mal feitos.Já passa da hora de se introduzirem medidas que corrijam essa desigualdade verificada entre as duas instituições, mediante a adoção de critérios que respeitem a realidade financeira do município como um todo. A Câmara tem de dar sua quota de sacrifício nessa fase crítica, em que a prefeitura reduz atividades, elimina investimentos, busca financiamentos bancários para reposição de equipamentos, está sufocada por precatórios impagáveis, começa a atrasar o pagamento da folha de pessoal e confessa a impossibilidade de quitar a do 13º salário.A contribuição do legislativo pode começar, por exemplo, com a revisão da forma de repasse dos recursos provenientes do executivo. A lei não estabelece percentual obrigatório, apenas fixa o teto de “até 6%” da receita própria do município. A transferência deveria tomar por base a prestação de contas mensal da Câmara: a prefeitura reembolsaria os gastos efetivamente realizados, até o limite legal. O legislativo não precisa acumular dinheiro em caixa, que sua atual direção apelida de “sobras”, levando-o a sonhar com projetos mirabolantes, como a construção de nova sede e a realização desse estapafúrdio congraçamento de Natal. Não se explica, por outro lado, ter sido reduzida, de 21 para 15 vereadores, a composição da câmara e continuarem no mesmo patamar os gastos. Ou as tais “sobras” estão elevadíssimas ou criaram-se despesas de custeio apenas para dar fim ao dinheiro que chega ao legislativo como se caísse do céu. O legislativo é essencial ao funcionamento do município, até por exigência constitucional. O que não se pode aceitar é que acabe transformando-se em peso insuportável para o contribuinte. Ainda há tempo de se cancelar a realização dessa festa de arromba.
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