O homem surpreendeu. Em vez de terno rosa-choque, a elegância do azul-marinho. Em lugar dos óculos escuros que escondem olhos e rosto, a delicadeza démodé do pincenê. A bengala lembrava os velhos parlamentares do Império. Do alto dos 70 anos e trajetória por passarelas e câmeras, Clodovil Hernandes decepcionou a todos que esperavam ver ali criatura folclórica. Ele chamou a atenção não pela figura, mas pelo discurso.Ao ser eleito, o estilista soltou o verbo. Disse que venderia o voto. Não por R$ 30 mil, mas por muito mais. Quando visitou o Congresso, anunciou que queria conhecer o ambiente para decidir a bolsa que usaria na estréia. Comentaristas de plantão não perdoaram. Anteciparam-lhe a breve cassação por falta de decoro parlamentar.Na tribuna, ele lembrou indiretamente o fato: “Já me passaram muito medo aqui com esse termo — decoro parlamentar. Eu não sei o que seria decoro porque a Câmara parece um mercado”. Surpresa! A babel de vozes e gritos comum no plenário se aquietou. Suas Excelências fizeram silêncio.Ouviram então um discurso piegas para o padrão da Casa, mas bem-vindo aos ouvidos dos eleitores. O deputado pregou a bondade e o altruísmo. Falou em amar os deputados.Falou na finitude da vida. E, em português claro, convocou todos ao trabalho. Quer mais? Passados os 18 minutos regulamentares, o presidente da câmara Arlindo Chinaglia lhe cortou o microfone. Escutou um sonoro “mal-educado”.
Impávido colosso, Clodovil Hernandes voltou à planície. Deixou a perplexidade. O homem que prometia ser motivo de chacota, conseguiu duas proezas inéditas. Uma: calou 330 deputados. A outra: em língua que todos entendem, disse o que 180 milhões de brasileiros queriam dizer. Sem mesuras ou excelências, chamou Maluf de corrupto na cara e classificou a turma de preguiçosa e mal-educada. Sem perder a elegância, claro.
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